EXPLICATUDO

EXPLICATUDO

FAMILIA E HISTORIA

 

A evolução da família e do conceito da instituição família ao longo da história tem-se revestido de características específicas. Nos tempos do Jurista Gaio ( Sec. II ) a família transmitia-se por herança e a este termo estava arreigado um forte conceito patrimonial, ou seja, a família era mais vista no sentido de propriedade e sucessão de propriedade material do que era vista no sentido das pessoas ( seres humanos livres e escravos / servos ) de que ela se constituía.

A queda do Império Romano no Sec V levou à introdução de formas de direito próprias dos povos bárbaros que o conquistaram, direito esse que era meramente costumeiro, embora alguns códigos sejam referidos pelos autores .

São estes textos assim chamados por constituírem uns mais do que outros compilações de direito costumeiro bárbaro conjuntamente com recolhas de direito romano e que têm importância para análise das definições de família, sociedade privada e Estado que estamos a estudar.

Contudo, e este aspecto é igualmente importante porque vem a fazer convergir todo um conjunto de concepções sobre a família, a sociedade privada e o Estado, o Direito Romano, desfeito o Império, ficou de alguma forma depositado na Instituição Igreja que resistiu em termos orgânicos ás invasões bárbaras.

Se de um lado o Direito que a sociedade vem a receber posteriormente pela recuperação dos textos romanos vem desde logo imbuída das concepções cristãs ( e exclusivamente católicas, na altura ) sobre estes planos substancias que estudamos, não será menos verdade que a ausência deste Direito romano durante um largo período, a utilização das codificações romanas só veio a mostrar-se indispensável já na Alta Idade Média por volta dos Secºs. XIV, XV ) veio a permitir interpretações próprias mais conjugadas com as concepções bárbaras.

Daí que, segundo Franz Wieacker em " História do Direito Privado Moderno", a estrutura social e a constituição da família não sejam muito tratados quando das acoplações tipicamente romanas aos Direitos locais. Segundo este autor tanto uma como outra não se deixam em geral modificar de forma duradoura por processos meramente intelectuais, porque a sensibilidade vivida e transmitida pela tradição se comporta como uma protecção directa e eficaz.

Contudo foi recebida do Direito Romano a plena incapacidade negocial do menor, a elevada maioridade ( 25 anos ), de acordo com um sentimento da vida correspondente a formas de hierarquização inter – pessoal de tipo autoritário. Mais tarde o direito matrimonial desenvolve-se com a Concílio de Trento, com as confissões luteranas e reformadas, com a secularização do Iluminismo, pelo que a influência do Direito Romano sobre as relações pessoais do direito matrimonial é quase nula, a não ser por via do Direito Canónico posterior.

Contudo, poderemos dizer que, desde o Sec. II do já referido jurista Gaio a situação pouco mudou em termos substanciais. A teoria cristã sobre as relações familiares e correlacionadas advém quase toda do Apóstolo Paulo, S. Paulo, onde se destaca quase uma negação da procriação, e referências ao casamento como um último recurso biológico / socialmente aceitável, ou tolerável.

" S. Paulo – Aos Coríntios, 6, 10 : " Não erreis, nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os afeminados, nem os sodomitas ( etc. )... herdarão o reino de Deus.

Idem, Idem , 7, 1: " (...) bom seria que o homem não tocasse em mulher;

Idem, 7, 2:" Mas, por causa da prostituição, cada um tenha a sua própria mulher, e cada uma tenha o seu próprio marido."

7,4:" A mulher não tem poder sobre o seu próprio corpo, mas tem-no o marido; e também, da mesma maneira, o marido não tem poder sobre o seu próprio corpo, mas tem-no a mulher."

7,8: " Digo, porém, aos solteiros e ás viúvas, que lhes é bom se ficarem como eu " ( continente ).

7,9: " Mas, se não podem conter-se, casem. Porque é melhor casar do que abrasar-se."

7,10: "Todavia, aos casados, mando, não eu, mas o Senhor, que a mulher se não aparte do marido".

7,11:" Se, porém se apartar, que fique sem casar, ou que se reconcilie com o marido; e que o marido não deixe a mulher".

7, 27:" Estás ligado a uma mulher? Não busques separar-te. Estás livre de mulher ? não busques mulher."

7,32:" (...) O solteiro cuida das coisas do Senhor, em como há-de agradar ao Senhor;

7,33: "Mas o que é casado cuida nas coisas do mundo, em como há-de agradar à mulher ".

7,34: " Há diferença entre a mulher casada e a solteira; a solteira cuida nas coisas do Senhor, para ser santa, tanto no corpo como no espírito; porém a casada cuida nas coisas do mundo, em como há-de agradar ao marido."

7,39: " A mulher casada está ligada pela lei, todo o tempo que o seu marido vive; mas se falecer o seu marido, fica livre para casar com quem quiser, contando que seja no Senhor."

Idem, 11, 7:" O varão, pois, não deve cobrir a cabeça, porque é a imagem e glória de Deus; mas a mulher é a glória do varão."

11,8:" Porque o varão não provém da mulher, mas a mulher do varão".

11,9: " Porque, também o varão não foi criado por causa da mulher, mas a mulher por causa do varão."

O conceito de família ( cristã neste caso ) confunde-se com o conceito de uma confraria religiosa, ou com pretensões à santificação, através da negação do impulso sexual e consequente favorecimento de uma disponibilidade para o serviço religioso.

Em termos de dissolução do casamento católico ainda hoje vigora um privilégio no divórcio católico chamado de Paulino, por se basear na Epístola aos Coríntios, n.º 7;versículos 12 a 16, que refere o casamento entre crentes e não crentes e quando tal facto não torne possível a vida conjugal e familiar sem ofensa da fé do convertido ( ao Cristianismo como será claro).

Embora S. Paulo admita o casamento de bispos e diáconos ( nº3; versículos 1 a 16 ), na 1ª Epistola a Timóteo, exigindo de ambos uma vida extremamente regrada e quase santa, já no anterior nº2; versículos 9 a 15 , a mulher é considerada de uma forma subalterna, como mãe do pecado original, não se lhe permitindo, por exemplo, que ensine nem que use de autoridade sobre o marido " mas que esteja em silêncio ".

Na mesma linha, mas com algumas alterações, o jurista Hugo Grócio, lança com outros autores os fundamentos de concepções do casamento e da constituição de família, e os princípios que pretendem dividir as concepções meramente contratuais do casamento e as concepções divinizadas do mesmo, colocando no seio do problema uma repescagem daquilo que era considerado o direito natural, ou seja, o direito que advinha da natureza como consequência em linha recta dessa mesma acção natural, desprezando quer as teorias contratuais humanas quer as teorias divinas.

Os fundamentos tornam-se importantes porque se reconhece que o casamento e a família se afastam do mero contracto de vontade entre partes ( embora o contenham ) na medida em que a contratualização pressupõe a paridade ( igualdade ) entre os contratantes, enquanto que no casamento o homem é o chefe natural tanto da mulher como da família.

Segundo este entendimento o casamento subordina a mulher ao homem – do mesmo modo que na maior parte dos seres vivos, embora no caso humano a situação obtenha um conteúdo ético de fidelidade da mulher como ser dotado de razão. A partir daqui, o direito natural de Grócio exclui desse mesmo direito natural a poliandria ( uma mulher com vários homens ), mas não a poligamia ( um homem com várias mulheres ), assim como não exclui o divórcio e o novo matrimónio dos divorciados.

Assim, e ainda através da aceitação do concubinato como sendo " uma união verdadeira e válida, ainda que despida dos efeitos jurídicos consequentes ( sucessão testamentária, etc. ) " entramos no Sec XIX onde a concubina apenas não podia entrar no mesmo lar da legítima esposa ( Código de Napoleão de 1810 ).



12/03/2008
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